VEM, QUE ESTOU PARA TAS DAR
Vem, que estou para tas dar,
chega-te, vida, que morro,
necessito de socorro,
não me queiras acabar:
estou já para estalar,
não me ajudas, por quem sou?
que para tas dar estou:
pois que é isto? tanto tardas?
acaba, vida, que aguardas?
Dá-mas, Mana, que tas dou.
Meu coração, que me abraso,
morro com tão lindo gosto,
que em perigo me tem posto
gosto de tão lindo vaso:
vê, que se vem passo a passo
estas lágrimas chegando:
dize, meu bem, para quando,
hão de ser? olha, que vem:
acaba, dá-mas, meu bem,
Que tas estou esperando.
Acrescenta o excessivo,
para o gosto acrescentar,
não queiras, vida, matar,
a quem morre, estando vivo:
e se em modo tão esquivo
o gosto sempre se apouca,
por que seja igual a troca,
que fazemos neste caso,
pois tens o membro no vaso,
Mete-me a língua na boca.
Hás, pois, vida, de advertir,
que em modo tão sublimado
se acha menos desmaiado,
quem mais se deixa dormir:
para mais tempo sentir,
o que estamos trabalhando,
quisera, vida, que quando
me canso para tas dar,
nunca quisera acabar,
Enquanto tas estou dando.
-- Gregório de Matos