Os antigos dividiam a literatura em poesia e prosa.
Uma e outra tinham seus cânones linguísticos.
A poesia -- seus metros açucarados (jambos e troqueus ou o vinagrete do "verso livre"), um vocabulário "poético" peculiar (corcel e não cavalo, infante e não moleque, e demais "flores-amores", "rosas-formosas") e seus temazinhos "poéticos" (antes: noite, amor; hoje: chamas, ferreiros).
A prosa -- heróis peculiarmente postiços (ele + ela + o amante -- romancistas psicológicos; o intelectual + a jovem + o guarda-civil -- romancistas de costumes; alguém de cinza + a dama desconhecida + Cristo -- simbolistas) e seu estilo literário-artístico peculiar (1. "o sol se punha atrás do morro" + amaram ou mataram = "os choupos farfalham lá fora"; 2. "vou dizer isto a você, Vaniazinho" + "o juiz da vara dos órfãos tomava da branquinha" = ainda veremos o céu coberto de diamantes; 3. "como é estranho, Adelaida Ivanovna" + ampliava-se o mistério assustador = coroado de rosas brancas).
A poesia e a prosa dos antigos estavam igualmente afastadas da fala prática, do jargão das ruas, da linguagem exata da ciência.
Nós dissipamos a velha poeira vocabular, aproveitando apenas a tralha de ferro das velharias.
Não queremos saber de nenhuma diferença entre a poesia, a prosa e a linguagem prática.
Nós conhecemos um único material da palavra e aplicamos a ele a elaboração de hoje em dia.
Trabalhamos com a organização dos sons da língua, a polifonia do ritmo, a simplificação das construções vocabulares, a precisão da expressividade linguística, a elaboração de novos processos temáticos.
Todo este trabalho não é para nós um fim em si mesmo estético, mas um laboratório para a melhor expressão dos fatos da atualidade.