A linguagem do cabelo
No Dicionário do Folclore Brasileiro, de Câmara Cascudo, descubro e me especializo na linguagem do cabelo. Obra de referência indispensável para quem estuda literatura folclórica ou simplesmente gosta de saber de histórias, lendas, fábulas, mitos e crendices que o Brasil herdou d'África e de Portugal, o Dicionário registra lá que, no início do século XX, a forma de arranjar a cabeleira feminina possuía um vocabulário próprio cuja significação amorosa o homem(namorado) entendia perfeitamente. Vejamos alguns significados dessa linguagem cifrada:
1) cabelo aparado na testa, com franja: "Estou feliz de te ver."
2) coque para trás: "Está perdendo seu tempo comigo."
3) coque no alto da cabeça: "Não consigo te tirar do pensamento."
4) cabelo dividido à esquerda: "Não."
5) cabelo dividido à direita: "Sim."
6) cabelo dividido no meio: "Sou tua", ou "Confio em ti".
7) com as orelhas descobertas: "Espero cartas, notícias, quero falar-te."
8) com a testa descoberta: "Não te quero", ou "Tenho outro alguém".
9) todo o cabelo puxado para trás: "Não tenho compromisso."
10) muitas tranças: "Há obstáculos demais ao nosso amor."
Há muitas outras tradições referentes ao cabelo. Mulheres solteiras costumavam usar cabelos soltos e compridos. As casadas, cabelos presos. As viúvas, em geral a cabeça coberta com uma touca. Já os cabelos cortados curtos significavam para a mulher renúncia completa à vaidade, como a das freiras e monjas. Isso sem falar na punição de mulheres acusadas de "vida dissoluta" e que consistia em rapar-lhes a cabeça. Uma punição também aplicada aos homens acusados de felonia, falsidade e covardia. No caso dos homens, ter cabelos no peito era sinônimo de valentia. E para quem exercia a bruxaria, os cabelos eram material precioso para a realização de feitiços. Por exemplo, uma porção de cabelo da cabeça seria usada para enlouquecer ou matar o desafeto. Um punhadinho de pelos púbicos, anularia a virilidade do alvo. Crenças, cada época com as suas.