13.2.14

Natália Correia




Retrato talvez saudoso da menina insular 


Tinha o tamanho da praia 
o corpo que era de areia. 
E mais que corpo era indício 
do mar que o continuava. 
Destino de água salgada 
principiado na veia. 

E quando as mãos se estenderam 
a todo o seu comprimento 
e quando os olhos desceram 
a toda a sua fundura 
teve o sinal que anuncia 
o sonho da criatura. 

Largou o sonho no barco 
que dos seus dedos partiam 
que dos seus dedos paisagens 
países antecediam. 

E quando o corpo se ergueu 
voltado para o desengano 
só ficou tranquilidade 
na linha daquele além 
guardada na claridade 
do coração que a retém




Verdadeira litania para os tempos da revolução


Mário nós não somos todos burgueses
os gatos e os ratos se quiseres,
os literatos esses são franceses
e todos soletramos malmequeres.

Da vida o verbo intransitivo
não é burguês é ruim;
e eu que nas nuvens vivo
nuvens! O que direi de mim?

Burguês é esse menino extraordinário
que nasce todos os anos em Belém
e a poesia se não diz isto Mário
é burguesa também.

Burguês é o carro funerário.
Os mortos são naturalmente comunistas.
Nós não somos burgueses Mário
o que nós somos todos é sebastianistas.