E a primeira, e a primeira, e a primeira memória, memória que tenho, que tenho de meu pai é dele me colocando no refrigerador. Ele tinha o hábito de tirar toda a roupa do meu corpo de cinco anos de idade e eu ficava sentada nua naquela prateleira prateada da geladeira. ... Então ele se abaixava em direção à gaveta dos legumes, abria a gaveta e tirava as cenouras, o aipo, a abobrinha, os pepinos. E aí ele começava a trabalhar o meu buraquinho, meu pequeno buraquinho, meu pequeno pequeno buraquinho. Meu buraquinho de menina. Me mostrando "como é ser como a mamãe", ele diz. Me mostrando "como é ser uma mulher, ser amada. Essa é uma tarefa para o papai", ele me diz. Trabalhando meu buraquinho. ... Então ouço minha mãe chegar em casa. E ela começa a gritar a plenos pulmões. "O que aconteceu com os legumes do jantar de hoje? Você andou brincando com sua comida de novo, menina? Eu ia fazer a receita favorita do seu pai." Eu apenas quero gritar, mas não posso, claro, "Mamãe, abra seus olhos! VOCÊ NÃO SABE QUE EU SOU A FAVORITA DO PAPAI?"
Karen Finley, no monólogo do "Refrigerador", San Francisco, 1990. Na foto, a polêmica autora e performer atuando em George and Martha, 2004.
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