11.2.05

Léon-Paul Fargue



Encontrado entre papéis de família


Tanto sonhei, tanto sonhei que não sou mais
Daqui.
Não me façam perguntas, não me atormentem
Não me acompanhem no meu calvário.

Não me é dado explicar-me as ordens.
Nem mesmo o direito de pensar nelas,
É mais que tempo de levantar-me e ir embora.

Ele consegue uma licença da morte e vem chegando.
Na curva da rua que leva à noite, espero por ele.
O mar já vai voltar a seus últimos terraços.
Uma primeira luz tem sede em meio às trevas.

Um passo na calçada. Sua sombra o precede
Deita-se sobre mim, a cabeça em meu peito.
Ele está aí.

Sempre de chapéu redondo, sempre de pasta na mão,

Tal como era, no dia em que voltou da Itália.
Rolo em sua direção como uma pedra obscura.
Não consigo transpor a sua sombra.

Estão passando bem de saúde? Que fizeram desde então?
Por que não subiram?
Todos os dias eu ia ver e vocês nada de chegar!

Não diz nada disso.
Mas tudo nele diz: Recorda-te.

A noite sobre ele se fechou.


Léon-Paul Fargue