Carta a Vitorino Nemésio
Talvez que o anjo esquecido,
O anjo da poesia,
Se tenha de mim perdido
Sem reparar que o fazia...
Por isso me faltam asas
E me sobejam as penas
De um desejo inalcançado:
Que eu gostava de voar
Até ao anjo perdido
O anjo de mim esquecido,
Que por mim é tão lembrado.
Ai se eu tivesse voado
Aonde queria voar
Não estava agora a rimar
Versos de asas cortadas.
Voava junto de si
Assim fico aonde me vê
Mesmo pregadinha ao chão
Com asas de papelão
E sem entender porquê.
Pois a uns faltam-lhe asas
Mas por ter asas cortadas
Sofrem uns e outros não?
Eu tenho sofrido muito
Nos meus voos ensaiados
Que ao querer sair do chão
Ficam-me os pés agarrados,
...E por falar dos pés
Com versos de pés quebrados
Perdoe lá a quem os fez
Pelo mal dos meus pecados
Só os fiz por timidez
Que tenho em me dirigir
A quem tem por lucidez
Razão para distinguir
O bom e o mau Português.
Assim à minha maneira
Aqui venho responder
Desta forma tão ligeira
Que a sério não pode ser!
335 Gafanhotos
335 gafanhotos
30 carochas
3 cabrochas
335 gafanhotos
Eu de galochas
30 carochas
Eram cem sapos
Cabras cabrochas
Vinham patinhos
Pintainhos
Outros bichinhos
Engraçadinhos
E as galinhas
Molhadinhas
Estupidazinhas
Iam atrás
Fui ao mar buscar sardinhas
Fui ao mar buscar sardinhas
Para dar ao meu amor
Perdi-me nas janelinhas
Que espreitavam do vapor
A espreitar lá do vapor
Vi a cara dum francês
E sejá lá como for
Eu vou ao mar outra vez
Eu fui ao mar outra vez
Lá o vapor de abalada
Já lá não vi o francês
Vim de lá toda molhada
Saltou-me de mim toda a esperança
Saltou do mar a sardinha
Salta a pulga da balança
Não faz mal, não era minha
Vou ao mar buscar sardinha
Já me esqueci do francês
A idéia não é minha
Nem minha nem de vocês
Coisas que eu tenho na idéia
Depois de ter ido ao mar
Será que me entrou areia
Onde não devia entrar?
Pode não fazer sentido
Pode o verso não caber
Mas o que eu tenho rido
Nem vocês queiram saber
Não é para adivinhar
Que eu não gosto de adivinhas
Já sabem que eu fui ao mar
E fui lá buscar sardinhas
Sardinha que anda no mar
Deve andar consoladinha
Tem água, sabe nadar,
Quem me dera ser sardinha!