21.6.09

Cesare Pavese




Como um leve jantar posto à clara janela.
Já está escuro no quarto e se vê pelo céu.
As estradas tranquilas lá fora conduzem,
em um breve percurso, aos campos abertos.
Como e olho pro céu -- quiçá quantas mulheres
fazem o mesmo a esta hora -- e o meu corpo está calmo;
o trabalho atordoa o meu corpo e as mulheres.

Terminado o jantar, as estrelas virão passear
sobre a vasta planície da terra. As estrelas têm vida,
mas não valem sequer as cerejas que como sozinho.
Vejo o céu, mas sabendo que em meio aos telhados
umas luzes já brilham e, por baixo, começam ruídos.
Com um trago o meu corpo degusta esta vida
das florestas e rios e se sente isolado de tudo.
Basta um curto silêncio e as coisas se assentam
em seu lócus real, como assenta o meu corpo.

Meus sentidos isolam as coisas que tocam
e as aceitam impassíveis: rumor de silêncio.
Sou capaz de entender cada coisa no escuro,
como sei que o meu sangue percorre estas veias.
A planície é um grande regato entre a relva,
um repasto de todas as coisas. Imóveis as plantas
e os minérios existem. Escuto o alimento nutrir
minhas veias de tudo o que vive no vale.

Não importa essa noite. O quadrante do céu
me sussurra uma cópia de sons, e uma estrela miúda
se debate no vácuo distante dos pastos
e das casas, discorde. Não basta a si mesma
e precisa de muitas parceiras. No escuro, sozinho,
o meu corpo está calmo e se sente supremo.



Cesare Pavese, "Mania de Solidão".


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