25.4.08





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18.4.08

Edmond Jabès




Deixei uma terra que não era a minha
por outra à qual também não pertenço.
Refugiei-me num vocábulo de nanquim,
e tenho o livro como espaço;
palavra de lugar nenhum, obscura fala do
deserto.
Não me cobri durante a noite.
Nem mesmo tentei me proteger do sol.
Andei nu.
De onde eu vinha, não fazia mais sentido;
Aonde eu ia, não incomodava ninguém.
Vento, digo-lhes, vento.
E um pouco de areia no vento.

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Estou à procura
de um homem que não conheço,
que nunca foi tão eu mesmo
quanto desde que comecei a procurá-lo.
Teria ele meus olhos, minhas mãos
e todos esses pensamentos semelhantes
aos destroços deste tempo?
Estação de mil naufrágios,
o mar deixa de ser mar,
para tornar água gelada dos túmulos.
Mas, mais longe, quem sabe mais longe?
Uma menina canta a contragosto,
enquanto a noite reina sobre as árvores,
pastora em meio a seus carneiros.
Venham arrebatar do grão de sal a sede
que nenhuma bebida poderá mitigar.
Com as pedras, um mundo se devora
para ser, como eu, de parte alguma.



Edmond Jabès, "A canção do estrangeiro".

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17.4.08

book art 3




Su Blackwell

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15.4.08

book art 2





O inconsciente do texto literário. O interessante é que o desejo que o escritor teve de escrever irá se projetar no leitor, não para escrever como o autor lido, mas para escrever a partir dele mesmo. A leitura é condutora do desejo de escrever... o que desejamos é apenas o desejo que o escritor teve de escrever: desejamos o desejo que o autor teve do leitor enquanto escrevia, desejamos o ame-me que está em toda a escritura.

Rafael Andrés Villari

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14.4.08

book art 1






- trabalho dos alunos do curso de Book Art, da Universidade de Montevallo, Alabama.

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12.4.08




Os dedos de vidro apontam para baixo. A luz escorre pelo vidro e forma uma poça verde. O dia inteiro os dez dedos do lustre derramam verde no mármore. As penas dos periquitos, lâminas estridentes de palmeiras, verdes também; agulhas verdes reluzindo no sol. Mas não pára o duro vidro de gotejar sobre o mármore; as poças pairam sobre a areia do deserto; por elas cambaleiam camelos; as poças se assentam no mármore, margeadas por junco, sufocadas por ervas daninhas; aqui e ali uma flor branca; o sapo pula; à noite as estrelas ficam lá, intactas. Aproxima-se a noite e a sombra varre o verde para cima da lareira; a superfície enrugada do mar. Não há navios chegando; as ondas vêm e vão sob o céu vazio. É noite e as agulhas agora derramam o azul. O verde foi embora.



Virginia Woolf, Verde.


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6.4.08

Paul Éluard





À peine défigurée

Adieu tristesse
Bonjour tristesse
Tu es inscrite dans les lignes du plafond
Tu es inscrite dans les yeux que j'aime
Tu n'es pas tout à fait la misère
Car les lèvres les plus pauvres te dénoncent
Par un sourire
Bonjour tristesse
Amour des corps aimables
Puissance de l'amour
Dont l'amabilité surgit
Comme un monstre sans corps
Tête désappointée
Tristesse beau visage





Paul Éluard, em La vie immédiate, 1932.




4.4.08




o mar ronrona como um lince





ezra pound

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3.4.08

Cecília Meireles




O mosquito pernilongo
trança as pernas, faz um M,
depois, treme, treme, treme,
faz um O bastante oblongo,
faz um S.

O mosquito sobe e desce.
Com artes que ninguém vê,
faz um Q,
faz um U e faz um I.

Esse mosquito
esquisito
cruza as patas, faz um T.
E aí,
se arredonda e faz outro O,
mais bonito.

Oh!
Já não é analfabeto,
esse inseto,
pois sabe escrever seu nome.


Mas depois vai procurar
alguém que possa picar,
pois escrever cansa,
não é, criança?

E ele está com muita fome.




Cecília Meireles, "O Mosquito Escreve".
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