15.9.15

Alejandra Pizarnik



La Verdad del Bosque


Como un golfo de soles este espacio hermético y transparente: una esfera de cristal con el sol adentro; con un cuerpo dorado (un ausente, querido tú) con una cabeza donde brillan los ojos más azules delante de sol en la esfera transparente.
La acción transcurre en el desierto y qué
sola atravesé mi infancia como caperucita el bosque antes del encuentro feroz. Qué sola llevando una cesta, qué inocente, qué decorosa y bien dispuesta, pero nos devoraron a todos porque ¿para qué sirven las palabras si no pueden constatar que nos devoraron? —dijo la abuela.
Pero de la mía no se vistió el lobo. El bosque no es verde sino en el cerebro. La abuela dio a luz a mi madre quien a su vez me dio a tierra, y todo gracias a mi imaginación. Pero allí, en mi pequeño teatro, el lobo las devoró. En cuanto al lobo, lo recorté y lo pegué en mi cuaderno escolar. En suma, en esta vida me deben el festín.
—¿Y a esto llamas vida? —dijo la abuela.


4.9.15

Herberto Helder





Minha cabeça estremece com todo o esquecimento. Eu procuro dizer como tudo é outra coisa. Falo, penso. Sonho sobre os tremendos ossos dos pés. É sempre outra coisa, uma só coisa coberta de nomes. E a morte passa de boca em boca com a leve saliva, com o terror que há sempre no fundo informulado de uma vida. Sei que os campos imaginam as suas próprias rosas. As pessoas imaginam os seus próprios campos de rosas. E às vezes estou na frente dos campos como se morresse; outras, como se agora somente eu pudesse acordar.

Por vezes tudo se ilumina. Por vezes canta e sangra. Eu digo que ninguém se perdoa no tempo. Que a loucura tem espinhos como uma garganta. Eu digo: roda ao longe o outono, e o que é o outono? As pálpebras batem contra o grande dia masculino do pensamento. Deito coisas vivas e mortas no espírito da obra. Minha vida extasia-se como uma câmara de tochas. - Era uma casa - como direi? - absoluta. Eu jogo, eu juro. Era uma casinfância. Sei como era uma casa louca. Eu metia as mãos na água: adormecia, relembrava. Os espelhos rachavam-se contra a nossa mocidade.

Apalpo agora o girar das brutais, líricas rodas da vida. Há no esquecimento, ou na lembrança total das coisas, uma rosa como uma alta cabeça, um peixe como um movimento rápido e severo. Uma rosapeixe dentro da minha ideia desvairada. Há copos, garfos inebriados dentro de mim. - Porque o amor das coisas no seu tempo futuro é terrivelmente profundo, é suave, devastador.

As cadeiras ardiam nos lugares. Minhas irmãs habitavam ao cimo do movimento como seres pasmados. Às vezes riam alto. Teciam-se em seu escuro terrífico. A menstruação sonhava podre dentro delas, à boca da noite. Cantava muito baixo. Parecia fluir. Rodear as mesas, as penumbras fulminadas. Chovia nas noites terrestres. Eu quero gritar paralém da loucura terrestre. - Era húmido, destilado, inspirado. Havia rigor. Oh, exemplo extremo. Havia uma essência de oficina. Uma matéria sensacional no segredo das fruteiras, com as suas maçãs centrípetas e as uvas pendidas sobre a maturidade. Havia a magnólia quente de um gato. Gato que entrava pelas mãos, ou magnólia que saía da mão para o rosto da mãe sombriamente pura. Ah, mãe louca à volta, sentadamente completa. As mãos tocavam por cima do ardor a carne como um pedaço extasiado.

Era uma casabsoluta - como direi? - um sentimento onde algumas pessoas morreriam. Demência para sorrir elevadamente. Ter amoras, folhas verdes, espinhos com pequena treva por todos os cantos. Nome no espírito como uma rosapeixe. - Prefiro enlouquecer nos corredores arqueados agora nas palavras. Prefiro cantar nas varandas interiores. Porque havia escadas e mulheres que paravam minadas de inteligência. O corpo sem rosáceas, a linguagem para amar e ruminar. O leite cantante. Eu agora mergulho e ascendo como um copo. Trago para cima essa imagem de água interna. - Caneta do poema dissolvida no sentido primacial do poema. Ou o poema subindo pela caneta, atravessando seu próprio impulso, poema regressando. Tudo se levanta como um cravo, uma faca levantada. Tudo morre o seu nome noutro nome.

Poema não saindo do poder da loucura. Poema como base inconcreta de criação. Ah, pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade. Porque eu sou uma vida com furibunda melancolia, com furibunda concepção. Com alguma ironia furibunda. Sou uma devastação inteligente. Com malmequeres fabulosos. Ouro por cima. A madrugada ou a noite triste tocadas em trompete. Sou alguma coisa audível, sensível. Um movimento. Cadeira congeminando-se na bacia, feita o sentar-se. Ou flores bebendo a jarra. O silêncio estrutural das flores. E a mesa por baixo. A sonhar.



2.9.15

...







Anne Sexton





The Sickness Unto Death

God went out of me
as if the sea dried up like sandpaper,
as if the sun became a latrine.
God went out of my fingers.
They became stone.
My body became a side of mutton
and despair roamed the slaughterhouse.
Someone brought me oranges in my despair
but I could not eat a one
for God was in that orange.
I could not touch what did not belong to me.
The priest came,
he said God was even in Hitler.
I did not believe him
for if God were in Hitler
then God would be in me.
I did not hear the bird sounds.
They had left.
I did not see the speechless clouds,
I saw only the little white dish of my faith
breaking in the crater.
I kept saying:
I’ve got to have something to hold on to.
People gave me Bibles, crucifixes,
a yellow daisy,
but I could not touch them,
I who was a house full of bowel movement,
I who was a defaced altar,
I who wanted to crawl toward God
could not move nor eat bread.
So I ate myself,
bite by bite,
and the tears washed me,
wave after cowardly wave,
swallowing canker after canker
and Jesus stood over me looking down
and He laughed to find me gone,
and put His mouth to mine
and gave me His air.
My kindred, my brother, I said
and gave the yellow daisy
to the crazy woman in the next bed.