18.6.15

12.6.15

Poetry and the Film Cinema 16 (1953)



Dylan Thomas, Arthur Miller, Maya Deren, Parker Tyler e 
Willard Maas discutem o papel da poesia na narrativa 
cinematográfica. O poeta Dylan Thomas viria a falecer 
poucos dias depois. Em 9 de novembro de 1953.
Como em todo debate, é curioso ver os antagonismos.
Dylan Thomas e Arthur Miller versus Maya Deren e
Willard Maas. Thomas apelando para o sarcasmo
com as ideias vanguardistas de Deren é um show à parte 
e um tanto lamentável diante da importância já
incontestável do cinema experimental.


10.6.15

Marta Chaves



[Podias obedecer a um registo de perder]

Podias obedecer a um registo de perder
o respeito, levantar a saia se a tivesses,
alçar a perna se cão fosses, mandar à merda
quem vem socorrer-te da vida e te decepa os dedos.

Com um rigor de artilharia que amortece o cansaço,
o combate quase parece sereno. De vez em quando,
fazes a conta de cor e dizes apesar de tudo, inspira-me
e não queres saber muito mais do que isto.

Estás na vida como na montra alguns relógios,
parado, e pensas numa sepultura no mar, tudo
menos esta terra, tudo menos uma corda, tudo menos
viver a pulso e ter de sacudir a chuva contra o casaco.

Os dias sem prognóstico, vivendo apenas para
esperar a madrugada, e que ela venha como o cortejo
e aprendas a ficar.

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6.6.15

2 poemas de Míriam Alves



INSONE OUÇO VOZES 

Calor afogueia 
os pensamentos de espera. Quando 
embalo na cama da noite 
insônia de séculos. 

Ouço ruídos de tambores 
sobressaltos alimentam 
meus pés 

Nos pensamentos de esperança
embalo na cama da noite
as dores de meu tempo

Ouço vozes 
emanadas dos exércitos humanos 
contidos. 

Na cama da noite 
movimento minhas mãos 
embalo medos, espanto-me 
diante do conhecido 

Nos pensamentos de espera 
solto minha rouca voz: 
bala de chumbo 

Nos pensamentos de esperanças 
espreito de olhos baços 
arregalados na insônia de aguardar 
a hora de entrar em ação. 



SABER DA CHAMA


Beber nesta chama
que esgueira silenciosa
tensa e dúbia
afogueando a garganta
aquecendo o berro
                o grito

Beber esta chama
sorvê-la
num só trago
senti-la derretendo
barreiras

Saber da chama
do caudal
da lava
da lama
vazando ardente
numa gota de palavra
pendurada num canto da boca
prometendo o encontro
na encruzilhada do amanhã.



Marina Tadeu




Diagnóstica


Sabes, com a menopausa
a cortisona e os antibióticos 
anti tuberculose
ando finalmente inchada
como se cada golfada de ar
por dentro ficasse pelo taco
ou por outro lance acobardado
com expulsões  
a prestações atrasadas
deste monstro cansado que afoga
entre oceanos o nosso Leviatã

Quando me disseram que ia morrer
dali a uns meses 
n ã o
pelas armas amor como antes
mas com tempo para dizer adeus
as flores não perfumaram 
com mais ou menos impiedade
o rastro do verme o circuito da abelha
nem o esterco nem o peixe
soltou bolha planetária em água impura
para nos lavar as mãos
ou a gaivota-mor estridente 
trespassou mais ou menos bicuda
uma outra cidade imunda
onde a vida de um filho cristalizada 
numa criança passiva e bela
pedia esmola para agradar
a nosso pendor dickensiano

Quando me marcaram a quimioterapia 
um alívio quieto mas tremendo trespassou
ainda alguma vaidade ferida num lamento
de não ter ido ao ensino superior
seduzir o senhor professor de filosofia
com esta demência precoce
em carne dura pois disso me arrependo sabes
nunca ter conseguido pensar
com o método de um argumento
metafísico justificando a crueldade
daquele Papa gagá que foi a Angola
revelar que o preservativo
é que provocava a SIDA
e que miséria é porque quer 
e não devemos
medir força à condição
conforme a lei natural do fatalismo
que rege sem discriminação
revistas em cabeleireiros
estratagemas mamíferos de silicone
e o manual de filigrama para principiantes

Como quem verdadeiramente fraco
desiste não fui capaz de dizer nada
procurar redenção última vontade
recado ao futuro, legado, perdão, remorso
rosa negra na mão romance completado
a quatro patas correndo
ou lamentar nunca ter vindo a lume
como sabes
e ri-me, ri-me com a audácia 
de me ter entregado todinha com o desejo em cera 
cobrindo os olhos à espera que os rasgassem 
com boca canora
os que nunca me quiseram sobretudo bêbedos
declamatórios que me enervavam muito com 
vagidos graves clamando auditório de melhor qualidade
que a dureza do meu ouvido colado à renda
suja do cabelo que iria finalmente perder
ao comprido como o corpo imobilizado no
CT scan, esquifóide, casca de ovo
e a imortalidade cingida à wikipedia

Um certo alívio sim de não ter de me matar
só porque a miopia nunca almejou a prateleira
dos prazos de validade 
absolvendo a fome como se pudesse

Curiosamente foram os estranhos
à corrida, os novos
como a Joana e o Helder
que perguntaram por mim
sem esperar resposta ou decerto favores
enquanto tu desajeitado em matéria de lirismos
e magoado por te dizer da baixeza mundana
dos que mais prezas conseguiste mesmo assim
dizer olá
mesmo assim ocupado a fazer malabarismo
para essas escolásticas 
com brincos de ouro
e civilizadas poses de retoque
a reboque de tua chama
essas de quem tenho ciúmes  
e que usam palavras
como incontornável e medíocre
e fazem do maiot a maiêutica
da celulite na testa e se preocupam 
com quem merece como elas
um sol privado no telhado
de casa hipotecada 
à banca que denunciam

Claro soube logo 
que não voltaria ao nosso país
onde há gente de bom gosto e dores de corno
gente magoada
por não ser reconhecida
num panteão onde aconteça nada
gente que aponta o dedo a pimba
depois de almoçar com o antigo colega de carteira
que foi ministro e poeta
gente com auditório
congresso, antologia e julgamentos sumários
gente que bate no ceguinho
e se identifica com a injustiça
de não dar mais nas vistas
e que proteges como pai
profissionalmente órfão
deixando voar nossa mosca transístor de Deus
que enxotavas com teu trompete anavalhado
e eu com minha voz enrouquecida
e quase livre a fugir para o acaso

Quando por erro me diagnosticaram
com cancro no pulmão
entendi que não era o sopro
que disfarçava no vento o poema perfeito
o poema pueril de sentimento
desmesurado que avilta
na lágrima a tristeza a nadar
no riso a alegria a tremer
na cama o amor a dançar
e no amor o coração a bater
em estátua tua em qualquer parte
de preferência insegura
e não formosa de asa
nua e crua
dura

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5.6.15

Abel Silva



Velhos II


Para onde vão os velhos brasileiros?

Os velhos paraíbas, as velhas prostitutas,

os velhos camelôs, o Dr. Rubis do Flamengo,

os velhos figurantes das chanchadas que voltam aos vídeos

domingueiros, onde fazem agora as

caretas da velhice?

Os velhos músicos de boate,

as vedetes dos últimos degraus, vão para onde?

Quando a vida derrete e despenca

para onde vão os velhos vendedores de chica-bom?

Eu não quero saber do destino

dos garfos

facas

dentes

cabelo

o menino que fui.

Quero é saber: para onde vão os velhos brasileiros?