27.12.18

João Cabral de Melo Neto


Graciliano Ramos:
Falo somente com o que falo:
com as mesmas vinte palavras
girando ao redor do sol
que as limpa do que não é faca:
de toda uma crosta viscosa,
resto de janta abaianada,
que fica na lâmina e cega
seu gosto da cicatriz clara.
Falo somente do que falo:
do seco e de suas paisagens,
Nordestes, debaixo de um sol
ali do mais quente vinagre:
que reduz tudo ao espinhaço,
cresta o simplesmente folhagem,
folha prolixa, folharada,
onde possa esconder-se a fraude.
Falo somente por quem falo:
por quem existe nesses climas
condicionados pelo sol,
pelo gavião e outras rapinas:
e onde estão os solos inertes
de tantas condições caatinga,
em que só cabe cultivar
o que é sinônimo da míngua.
Falo somente para quem falo:
quem padece sono de morto
e precisa um despertador
acre, como o sol sobre o olho:
que é quando o sol é estridente,
a contrapelo, imperioso,
e bate nas pálpebras como
se bate numa porta a socos.


25.12.18

Mário Pedrosa



Documentário sobre o crítico de arte Mário Pedrosa e sua relação com jovens artistas brasileiros, ao longo de três gerações, entre eles: Helio Oiticica, Lygia Clark, Lygia Pape, Abraham Palatnik, Almir Mavignier, Antonio Manuel e Cildo Meireles. A participação de Pedrosa na formação destes artistas se deu mediante uma intensa troca de ideias e experiências, que refletiram no rumo das artes plásticas no Brasil. Com uma abordagem delicada e sensível às relações pessoais, o filme apresenta um viés pouco explorado da relação entre crítico e artista, bem como busca representar as obras de arte a partir das potencialidades do audiovisual.




A história do 'politicamente correto'

http://mykristeva.tumblr.com/post/181405828235/um-álibi-para-o-autoritarismo-por-moira-weigel

Louis Aragon - Suicide - 1924

18.12.18

7.12.18

Paul B. Preciado




Perlas y cicatrices para Pedro Lemebel

Paul B. Preciado (antes Beatriz Preciado)



Puto sida, puto cáncer de laringe, puta dictadura y puta fachada de democracia, puta mafia machista a la que siguen llamando partido, puta censura, putas parejas y putas rupturas, puto Pedro y puto Pancho, puta televisión, putos movimientos alternativos, puto socialismo, puta Iglesia colonial, putas ONGs, putas multinacionales farmacéuticas, puta farra neoliberal post-dictatura, puto mapa del Cono Sur, puto consenso cultural, puto turismo, puta tolerancia, putas bienales de arte y puto museo de la homosexualidad. Puta tú y puto yo. Puto tu cuerpo que ha perdido. Y puta tu alma que no perderá nunca. Puta la multitud minoritaria frente a un solo hombre armado. Putas las yeguas y puto el río Mapocho. Putos los días que pasamos juntos en Santiago, putas las noches de Valparaíso, putos tus besos y puta tu lengua. Mirábamos al Pacífico y yo citaba a Deleuze: «El mar es como el cine, una imagen en movimiento». Tú me decías: «No te hagas el intelectual, machito. La única imagen en movimiento es el amor». Tú me criaste y de ti salí como un hijo, de los cientos que tuviste, inventado por tu voz. Tú eres mi madre y te lloro como se llora a una madre travesti. Con una dosis de testosterona y un grito. Tú eres mi madre y te lloro como se llora a una madre comunista e indígena. Con una hoz y un martillo dibujados sobre la piel de la cara. Tú eres mi madre chamana y te lloro como se llora a la ayahuasca. Salgo a las calles de Nueva York y me abrazo a un árbol radiactivo mientras te pido perdón por no haber venido a verte. Por el miedo a la memoria de la tortura, por el miedo a los perros muertos de hambre y a las minas de Antofagasta. Los diamantes son eternos y las bombas también. El sida habla inglés. Dices «Darling, I must die» y no te duele.Y el cáncer no habla. Te mueres silenciosa como una barbie cutre, sudaca, proletaria y marica. Incorrupta eres, como una diosa trans-andina. Y nos arrancarán de la historia los libros que ya no escribirás. Pero no tu voz. Y nacerán otra vez mil niños con la alita rota y mil niñas que llevarán tu nombre. Pedro Lemebel. Mil veces, en mil lenguas.


(no site El Estado Mental)




5.12.18

Smooth Operator - Exorcismus in Capitalismus - 13 faixas

1.12.18

26.11.18

Penelope Trappes

Monolithic Nuance by Cruel Diagonals

24.11.18

Ragnar Kjartansson, The Visitors Complete Video

Atomic Bomb Compilation 22 track album

17.11.18

16.11.18

Memória Anarquista

25.10.18

24.10.18

Anne Sexton



Lessons in Hunger


'Do you like me?'
I asked the blue blazer.
No answer.
Silence bounced out of his books.
Silence fell off his tongue
and sat between us
and clogged my throat.
It slaughtered my trust.
It tore cigarettes out of my mouth.
We exchanged blind words,
and I did not cry,
and I did not beg,
blackness lunged in my heart,
and something that had been good,
a sort of kindly oxygen,
turned into a gas oven.
Do you like me?
How absurd!
What's a question like that?

What's a silence like that?
And what am I hanging around for,
riddled with what his silence said? 





Pablo Milanés - La vida no vale nada

http://mykristeva.tumblr.com/post/179389347880/tatibitati-pablo-milanés-la-vida-no-vale

22.10.18

Primitive Knot

Vaporwave

Acetone

Cartea de Piatra

Shida Shahabi

10.10.18

Elena Firsova: Tristia (Osip Mandelstam)





Elena Firsova TRISTIA Op. 22 1979 Cantata for soprano and chamber orchestra on poems by Osip Mandelstam (in Russian) 1. Andante (orchestral) 2. Lento (soprano solo) 3. Andante (soprano and orchestra) 4. Vivo (soprano and orchestra) 5. Adagio (soprano and orchestra) 1.1.1.1 – 2.0.0.0 – perc (2 wood bl, 2 bongos, tam-t, tubular bells, glsp, vibr). harp. cel. strings (4/3/4/3/1) Duration: 16’ First performance: 17 October 1981, Moscow Conservatoire Irina Muratova (soprano) – Orchestra of the Moscow Conservatoire – Eduard Serov (conductor) Publisher: © Sikorski, Hamburg for the world English translation of the poems by D.Smirnov-Sadovsky


Tomaž Šalamun

5.10.18

María Emilia Cornejo



Soy la Muchacha Mala de la Historia

soy
la muchacha mala de la historia,
la que fornicó con tres hombres
y le sacó cuernos a su marido.
soy la mujer
que lo engañó cotidianamente
por un miserable plato de lentejas,
la que le quitó lentamente su ropaje de bondad
hasta convertirlo en una piedra
negra y estéril,
soy la mujer que lo castró
con infinitos gestos de ternura
y gemidos falsos en la cama.
soy
la muchacha mala de la historia.





María Emilia Cornejo

http://mykristeva.tumblr.com/post/178764125000/muitoeamiude-como-você-estabeleceu-sozinha

3.10.18

23.9.18

15.8.18

Bill Seaman Epiphanies

13.8.18

10.6.18

3.6.18

21.5.18

RIP Assionara Souza




As mulheres do sabonete Araxá
São cinquentonas gostosas
E moram em casas largas 
Com cães latindo felizes em torno de suas saias
No que o sol dá as caras, elas vêm abrir janelas
Com um gesto expansivo de um Jesus recendescido do eterno crucifixo
O olhar doido doidinho pra dar dentadas no dia
Se possível, sem alvoroço
Há espaço para todos no coração dessas três
Agora cuidam das mães
Abraçam e beijam os netos
E riem, como elas riem com as frases que eles dizem
A primeira - não insistam!
Só faz ligações pra fixo
Imagino ela se enrolando no fio do telefone tipo a mocinha do filme
Emoldurada na porta que dá para um jardim
Me conta as últimas novidades 
Os casos mais descabidos 
Fico por dentro de tudo e ainda arrisco um palpite
Ai, essa eu amo muito demais e desejo
A segunda é das redes sociais
Tem perfil em vários sites 
Adoro quando ela agarra o gargalo do frisante
Fica assim meio alisando e me falando dos amantes
Dos olhos saem faíscas da vingança de saber
Por trás de cada calça o tipo de pau que resguardam
Me segreda esse segredo com a língua em meu ouvido
Ai, essa eu amo muito demais e desejo
A terceira já foi prostituta linda que eu namorei 
Fazia ponto na esquina da quadra de minha rua
E quando o frio batia, batia de não ter jeito
Eu ia lá ter com ela, dividir um cigarrinho
E um gole do bom conhaque
Ouvir confissões doídas
Tomar ódio de polícia
Imaginar um movimento e fazer revolução
Meus reinos e meus festins, tudo por esses olhares 
A alegria tão lírica
Os mantras que elas recitam 
As velas de sete dias para São Jorge Guerreiro
Novena de Nossa Senhora e o sagrado feminino
Sagrações da primavera, conselhos, receitas, chás
Tudo isso eu adoro
Nessas mulheres tesudas do Sabonete Araxá!
Não quero nunca que morram
Minha vontade por elas vem de um tempo tão antigo
De quando os homens  do mundo
Um mundo avesso a esse nosso
Eram gentis cavalheiros 
Respeitavam bem as moças
E cuidavam das crianças
Lágrima havia nenhuma
Só amor e temperança e cantigas de ninar
Essas cinquentonas lindas ainda me bouleversam 
Hipnotizam meus reinos, embriagam meus festins
Esses versinhos chinfrins, deixarei tudo pra elas
A cismar sozinho à noite
Abro um livro já antigo
Fico lendo e repetindo o poema feito reza
Ao poeta solitário que inventou essa balada
Vou dormir bem convencido:
Tenho mais do que preciso
Desejo só o que quero
Tudo belo belo belo


Assionara Souza, "Bandeira".

19.5.18

Paul Bowles - Black Star at the Point of Darkness - 9 faixas

18.5.18

Roberta Jean




'The first in a sequence of three films, together forming a new screen version of Roberta Jean’s critically acclaimed live work Brocade. Lace was shot on location at MYB Textiles in Ayrshire, the only producer in the world to still manufacture patterned lace with original Nottingham Lace Looms. Here, human movements align and juxtapose with the choreography and soundtrack of the machines and voice.’



12.4.18

4.4.18

13.3.18

Maurice Blanchot





Blanchot, "Literature and the Right to Death".


12.3.18

Ingeborg Bachmann



O tempo adiado

Vêm aí dias piores.
O tempo adiado até nova ordem
surge no horizonte.
Em breve deves atar os sapatos
e espantar os cães para os charcos.
Pois as vísceras dos peixes
esfriaram no vento.
A luz da anileira arde pobremente.
Teu olhar pressente a penumbra:
o tempo adiado até nova ordem
desponta no horizonte.

Do outro lado afunda tua amada na areia,
ele sobe-lhe pelo cabelo esvoaçante,
ele corta-lhe a palavra,
ele ordena-lhe silêncio,
ele encontra-a mortal
e pronta para a despedida
depois de cada abraço.

Não olha para trás.
Amarra teus sapatos.
Espanta os cães.
Joga os peixes ao mar.
Anula a anileira!

Vêm aí dias piores.

(trad. Claudia Cavalcanti, Die gestundete Zeit)

8.3.18

Victor Heringer


Não sou poeta
Agora que os estalos da adolescência passaram
e a vida assenta como uma cômoda de mogno
agora que os joelhos estalam quando me levanto
sem mulher, sem filhos, mas com emprego estável
é preciso admitir que não sou poeta.
Embora o meu amor esteja solto no mundo
violento, semicego e ferido no ombro
não sou poeta.
Todos me felicitam. Que bom, dizem
vida de poeta é muito difícil.
Logo a gente chega a ser homem
e acaba com as coisas de menino.
A vida afunila.
Eu tinha dois, três truques nos bolsos
de calças compradas em shoppings.
Não soube nunca comprar como poeta
a longa espera por um par de sapatos
sentinela no deserto.
Os sapatos são fabricados e os pés dos poetas passam anos se deformando. Até que um dia cabem.
Por isso qualquer roupa parece velha
no corpo de um poeta.
Por isso estão sempre se desculpando
pelas roupas velhas.
Mas em segredo se orgulham.
Embora eu tenha um corpo
que pode ser confundido com o corpo de um poeta
não sou poeta.
Tenho as pernas fortes e os braços magros.
O torso amolecido dos boxeadores
os órgãos de dentro estropiados.
Mas quem me vê nu instintivamente sabe que não sou poeta.
Não levantei a mão esquerda em golpe de dançarina de flamenco ao ler Jaime Gil de Biedma para os meus amigos,
embora tudo tenha conspirado para isso.
Para que se me entranhassem as coisas.
Concluo que não sou poeta.
Tenho os dedos frios de um técnico em informática
e sou triste como um técnico em informática
mas não sou tão triste quanto um barbeiro.
Eu li todos os tratados da métrica portuguesa.
Assinei dois contratos como poeta
que doravante já não têm validade.
Assinarei um terceiro, como última traição.
Serei perdoado por todos.
Doravante vão reinar o olho e a raiva.
As melhores botas para caminhar na areia
os cálculos de longas distâncias
os treinamentos de apneia.
O amor virá até mim como vai aos jornalistas e CEOs, aos sushimen de São Paulo (SP) que vieram do Ceará – ideais porque têm mãos quentes.

As partes elegem o Foro da comarca de São Paulo (SP), renunciando a qualquer outro, por mais privilegiado que possa ser, para dirimir todas as questões surgidas quanto à interpretação ou execução deste contrato que não puderem ser resolvidas amistosamente.

27.2.18

Golgona Anghel




Porque falta meia hora antes de 
tomar o comprimido para dormir,
porque mesmo depois de tanto tempo
fazes de mim o filho com síndroma de Down
de Arthur Miller,
porque escrever não é só abrir cabeças
com o bisturi de Lacan,
e porque um poema não é a Isabella Rossellini
a chorar todos os sábados à noite,
nem o casal encontrado abraçado
na paralisia bucal do Vesúvio.
Porque a poesia não é a ponte Mirabeau
num cartaz de néon de adolescência,
porque hoje, quando ligaste,
era apenas porque te tinhas enganado no número,
porque estou cansado, voilá,
e não consigo evitar a noite,
penso agora em ti, Juliana,
heroína no sentido naturalista do termo,
penso sobretudo no teu arzinho
de provocação e de ataque.


Podias ter sido a Maria Eduarda
do cinema norte-americano,
a rapariga que ajudou a pôr fim à guerra no Vietname,
a Frida Kahlo e o Kofi Annan,
a estátua de Notre Dame.

O teu sentido reformista,
o teu olhar de Eça socialista,
cá está,
tinhas cabeça para embaixadora da boa vontade,
pés para andar nos corredores da ONU,
o feitio da botina, a mania, a despesa.

Mas continuas a dormir no teu cacifo húmido,
de cara para a parede
enquanto 20 repúblicas foram perpetuando
campanhas eleitorais e golpes de estado
nos jornais com os quais limpas os vidros da cozinha.


Coitada, coitadinha, coitadíssima,
permaneces na sala, um pouco pálida e fraca,
mas restituída aos deveres domésticos
e aos prazeres da sociedade!

O feitio da botina, a mania, a despesa,
o cheiro a terebintina.
Ó Juliana Couceiro Tavira, per omnia saecula,
chega para cá a garrafa e o cinzeiro;
temos assuntos por tratar e meia hora de critérios.