19.2.03

A literatura das "boas maneiras" através dos tempos


séc. 13:

- Quando assoar o nariz ou tossir, vire-se de modo que nada caia em cima da mesa. (De la zinquanta cortesie da tavola, Bonvicino da Riva)

séc. 15:

- É indelicado assoar o nariz na toalha da mesa. (Ein spruch der ze tische kêrt)

- Não assoe o nariz com a mesma mão que usa para segurar a carne. (S'ensuivent les contenances de la table)

séc. 16:

- Assoar o nariz no chapéu ou na roupa é grosseiro, e fazê-lo com o braço ou o cotovelo é coisa de mercador. Tampouco é muito mais educado usar a mão, se imediatamente limpa a meleca na roupa. O correto é limpar as narinas com um lenço e fazer isto enquanto se vira, se pessoas mais respeitáveis estiverem presentes. Entre a meleca e o escarro há pouca diferença, exceto que o primeiro fluido deve ser interpretado como mais grosso e o segundo como mais sujo. Os autores latinos confundem constantemente o babador, o guardanapo, ou qualquer pedaço de linho, com o lenço. (...) É indelicado engolir a saliva, como também aqueles que vemos escarrando a cada 3 palavras, não por necessidade, mas por hábito.(...) O som do peido, especialmente das pessoas que se encontram em lugar elevado, é horrível. Sacrifícios devem ser feitos, com as nádegas fortemente comprimidas. Tossir para ocultar o som explosivo: aqueles que, porque estão embaraçados, não querem que o vento explosivo seja escutado, simulam um acesso de tosse. (...) Considerando a insalubridade de reter o peido: há uns dois versos no volume II dos epigramas de Nicharchos em que ele descreve a capacidade do peido retido de provocar doenças, mas uma vez que esses versos são citados por todo mundo, não vou comentá-los aqui. (De civilitate morum puerilium, Erasmo)

- Não ofereça o lenço a ninguém, a menos que ele esteja recém-lavado... Tampouco é correto, após assoar o nariz, abrir o lenço e olhar dentro dele como se pérolas e rubis pudessem ter caído de sua cabeça.(...) O que direi então... daqueles que enfiam o lenço na boca? ( Galateo, Della Casa)

séc. 17:

- À mesa assoar abertamente o nariz no lenço, sem se ocultar atrás do guardanapo, e enxugar o suor com ele...são hábitos sujos que dão a todos desejo de vomitar...Evite bocejar, assoar o nariz e escarrar. Se for obrigado a proceder assim em lugares mantidos limpos, use o lenço, ao mesmo tempo virando o rosto e ocultando-se com a mão esquerda, e não olhe para o lenço depois. (Nouveau traité de civilité, Courtain)

séc. 18:

- Há alguns anos as pessoas faziam uma arte do ato de assoar o nariz. Um imitava o som do trompete, outro o miado do gato. A perfeição residia em não fazer nem muito nem pouco ruído. (Le voyageur de Paris, La Mésangère)

- Na igreja, nas casas dos grandes, em todos os lugares onde reina a limpeza, você deve escarrar no lenço. Constitui um hábito imperdoavelmente grosseiro de crianças cuspir no rosto de seus companheiros de folguedos. Não há castigo que seja suficiente para essas maneiras deploráveis, como também para quem cospe pelas janelas, nas paredes e nos móveis...("Les Règles de la bienséance et de la civilité chrêtienne", La Salle)

séc. 19:

- Escarrar a todo momento é um hábito repugnante. Além de grosseiro e atroz, é muito ruim para a saúde. ("The habits of good society")

séc. 20:

- Você já notou que hoje relegamos para algum canto discreto o que nossos pais não hesitavam em exibir abertamente? Por isso mesmo, certa peça íntima tinha um lugar de honra... ninguém pensava em ocultá-la da vista. O mesmo se aplica a outra peça de mobília não mais encontrada em residências modernas, cujo desaparecimento alguém lamentará talvez nesta era de "bacilofobia": estou me referindo à escarradeira. (Moeurs intimes du temps passé, Cabanès)

-- Em "O Processo Civilizador", de Norbert Elias, 1939.