18.11.02

Jack Kerouac

NUM HORRÍVEL APOSENTO em Nova York, toda a minha família, composta por mamãe, papai & Nin e eu, se instala e "todos conseguiram emprego" -- aqui dentro já é noite, e há uma única luz, muito fraca, acesa -- a gente conversa, mas é um papo meio esquisito -- parece que não sei o que faço e sem querer, ou por descuido (porque não sinto medo da raiva das mulheres da família e já me esqueci da de meu pai; faz tanto tempo que ele morreu), começo a enrolar um baseado, continuando a falar com eles uma porção de maluquices, empolgado, louco (por causa da erva); nem sequer prestam atenção, preferindo debater solenemente a meu respeito, até que meu pai se levanta e pergunta: "Mas ele não tem medo da maconha? Hem?" se aproximando de mim -- vejo que vem vindo e fico cego, a escuridão toma conta por completo da cena, mas sinto, contudo, a mão dele no meu braço; é possível que tenha um machado, qualquer coisa, e não consigo enxergar -- caio desmaiado feito morto no escuro, com um rugido que me acorda e impede que seja encontrado morto (se é que existe uma coisa como a morte) de manhã, na cama -- pois meu sangue parou de palpitar quando o Viajante Amortalhado cravou finalmente as garras em mim -- se aproxima cada vez mais -- agora já sei como fugir dele -- não me preocupando nem acreditando na vida ou na morte, se é que isso pode ser possível num humilde Pratyeka a essa altura.

-- Em "O Livro dos Sonhos".